(TW: solidão trans*)
Hoje acordei e não sabia bem onde estava
Vi que meu corpo estava em minha cama
Mas eu não estava lá.
Eu então vi que eu não estava em lugar nenhum.
Sempre brinquei tanto com o desejo
O desejo me era amigo, íntimo, companheiro
E agora
Desejo, para mim, é nada mais que uma lembrança longínqua
Me sinto assexuada em meio à multidão libidinosa
Quem é que iria me querer?
Não tenho aquele masculino que atrai as moças que gostam de meninos
Também não há em mim o feminino que desejam as que gostam de meninas
--
Cansada de ser eu...
Aliás, quem sou eu, quem poderei ser?
Se não posso ser senão junto
Se minha história é a história de meus amores
Se me encontro em cada encontro em meu caminho
Quem poderei ser se sou só?
Fico vazia de mim.
Eu, que sempre esbanjei libido
Me castro diante do desejo dos outros
Que afirmam, com razão, como sou linda
E maravilhosa, e até sexy
Mas é um sexy que só desperta desejo nos outros
E esses outros ainda não encontrei
(O desejo não vem senão daqueles que aprenderam, vez ou outra na vida,
Que só sou objeto superficial e carnal,
Mas não digna de uma relação, de afeto, de amor)
Eu, que sempre tive relações tão próximas,
Que sempre tive trocas profundas
Com todes que passaram por minha vida
Eu, que amo tanto amar profundamente,
Encontro-me de repente procurando sexo
Só sexo, sem sentimento, sem troca, sem nada. Só para poder sentir-me um pouco desejada.
E vejo-me fechando ao mundo
Não brincando como sempre brinquei
Não amando como sempre amei
Não sou mais eu
Perco minha libido
Perco meus encontros
Mais uma vez na vida, mal posso conversar sem medo
Esse medo me domina
Fico só. Com medo. Um medo só.
E de repente o que fica é só o medo.
--
Não queria ter dormido
Não queria ter acordado.
O medo da vida agora se mistura com quem eu sou.
Meu gênero se confunde com a solidão.
Queria ainda não saber onde estou. Mas agora vejo bem.
Estou aqui.
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